sábado, 16 de outubro de 2010

Crônica: Eficiência sem "D"


 
Na história "Almir, um garoto especial" da revista Mônica 27
já retratado um pouco do cotidiano do deficiente.
 
 


Cheguei à fábrica, na área industrial de Curitiba, pelo meio de uma tarde bonita de sol.
Plínio estava ansioso para me mostrar sua linha de produção, de onde saíam diversos artigos da "Turma da Mônica". Tudo em plástico.
Depois do clássico cafezinho, iniciei o "tour" pela indústria. Impecável, limpinha, pintadinha de novo, com tudo no lugar certo e funcionários uniformizados, realizando suas tarefas com aparente satisfação.
Mas comecei a notar alguma coisa diferente a partir de nossa passagem por um setor da fábrica onde o ruído das máquinas era quase que ensurdecedor. E apesar disso, todos os operários trabalhavam sem proteção nos ouvidos e não manifestavam insatisfação.
Foi quando Plínio, meio aos berros, me informou que todos, ali, eram surdos. Ele os contratava justamente porque aquele tipo de trabalho exigia máquinas muito barulhentas.
No setor seguinte havia dezenas de operários montando pequenas peças, encaixando-as, num trabalho mecânico, monótono, repetitivo. Plínio me informou que eram operários com um tipo de deficiência que impelia a repetir gestos com extremo cuidado e precisão. Mais adiante, outros deficientes físicos trabalhavam em máquinas que podiam ser operadas com uma só mão. Nas bancadas seguintes, operários sentados manipulavam e mostravam novos produtos ao lado das cadeiras de rodas que usariam, depois, para irem embora.
A telefonista também estava entre os funcionários com deficiência física.
Trabalhava sem as pernas mecânicas, encostadas a um canto até o sinal da saída. Mas uma sua colega terminara seu turno. E já se encaminhava para a porta. Plínio me chamou a atenção para que eu observasse sua passagem pelo pátio, pelo jardim, até que ela chegasse ao portão da fábrica onde permaneceu à espera do ônibus da empresa. Era cega. Mas dominava totalmente o conhecimento espacial do lugar. Nem usava bengala branca.
Mas não havia apenas ela, de deficiente visual. Outros operários, treinados para conferir qualidade e resistência em alguns dos produtos da firma, compunham o grupo de cegos. E como a vida não é só de trabalho, nos intervalos para o almoço ou café, esses operários vinham até uma quadra especial montada pelo Plínio onde praticavam um incrível futebol. Para tanto, a quadra era marcada com linhas em alto relevo para indicar limites da área de jogo, do meio do campo, da pequena área, proximidade do gol...
E a bola era recheada de guizos.
Essa visita que eu fiz à fábrica de Curitiba já tem bom tempo.
Depois disso, em diversas cidades do país, já há providências para que os deficientes físicos gozem do seu direito de trabalhar e exercer sua cidadania. Felizmente.
Mas ainda há um longo e difícil caminho pela frente. Infelizmente.

Um comentário:

  1. Super Bacana esse relato. Apesar de faltar muito ainda para o nosso país ser um lugar onde os deficientes terão tantas oportunidades quanto qualquer cidadão, é muito bom saber que já existem pessoas/empresas preocupadas com essa realidade. Parabéns por essa postagem e por todo o blog que está incrível!!

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